terça-feira, 22 de junho de 2010

eu também quero uma realidade inventada

Estava eu cá com meus botões...e as palavras de Clarice...e como não existem palavras não ditas, faço das palavras dela as minhas...

É curioso não saber dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer. Sobretudo tenho medo de dizer porque no momento em que tento falar não só não exprimo o que sinto como o que sinto se transforma lentamente no que eu digo...estou tentando me entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, tenho medo dessa desorganização profunda. E, como artifício em busca da ordem ou a sensação de ordem, me perco no caminho pela ânsia de acertar.

Sou como você me vê ... Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania,
Depende de quando e como você me vê passar ... É que por enquanto a metarmofose de mim em mim mesma não faz sentido. É uma metamorfose em que eu perco tudo o que tinha, e o que sou. E agora o que sou? Sou: estar de pé diante de um susto. Sou: o que vi. Não entendo e tenho medo de entender, o material do mundo me assusta, com seus planetas e baratas.

Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. A semiótica que o diga. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. O mundo acaba sendo mais confortável de cabeça para baixo. Não entender é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo pois tenho a clareza em mim que quanto mais sei, menos sei.

...há impossibilidade de ser além do que se é - no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio, sou mais do que eu, quase normalmente - tenho um corpo e tudo que eu fizer é continuação de meu começo...a única verdade é que vivo. Sinceramente, eu vivo.

E, em meio a tudo isso... uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inclusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora de minha própria vida.

Sonhei essa noite como a tempos não lembrava. Foi um sonho bom, com gosto e cheiro conhecidos. Pode parecer estranho, mas tenho memória de cheiro e de gosto. Fui preenchida por uma sensação familiar de segurança, de amor e cumplicidade. Foi um sonho muito bom. Tão bom que ao acordar me dei conta que era um sonho, e a realidade de tão dura me partiu o coração.

Sinto saudade. Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida.

E apesar de tudo, ainda espero esse teu mistério conhecido, mas é o que eu quero. E quero inteira, com a alma também. Apesar de tudo, ainda te amo. Mas como se começa do final? Eu não sei. Por isso, não faz mal que você não venha, esperarei quanto tempo for preciso.


Sou uma filha da natureza: quero pegar, sentir, tocar, ser.
E tudo isso já faz parte de um todo, de um mistério.
Sou uma só... Sou um ser. E deixo que você seja. Isso lhe assusta?
Creio que sim. Mas vale a pena.
Mesmo que doa. Dói só no começo.

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